domingo, 31 de julho de 2011

Ilex paraguariensis

             Se tu chegas em casa com este rosto obscuro, vou te observar. E se falas com esta voz calada, quase muda, irei te interpretar. Colocarei em prática toda minha necessidade de captar as diferenças no ar.
            Tu pões a mão sobre meu ombro, abre um sorriso falso, pra fingir que está tudo bem, como se eu fosse idiota, como se eu não soubesse das modificações que a vida causa no amor.
            Aquele nosso sentimento, que mais parecia um turbilhão de tão barulhento, andava quietinho. Era um sobrevivente apenas.
            Enquanto eu acompanho esta cerimônia, tu vais e prepara um novo chimarrão. Mas, meu amor... Tu hás de convir que a água do nosso mate já esfriou e não esquenta mais. Ou tomamos este mesmo, frio e lavado, ou vamos atrás de um novo. Eu sei meu bem, que este foi curto, mas era de boa qualidade. Se tivesse sido longo, talvez não tivéssemos conseguido tomá-lo até o final.
            Então vai, desliga esta água e me abre a porta, pois preciso ir.
Guarde teu beijo e teu abraço que eu não quero que isto doa mais do que já está.
E, por favor, lembre-se de mim desta forma forte, perdida e impulsiva. Pois neste joguinho de sorte e azar, mateando entre trucos e retrucos, foste meu falta-envido. Valendo nós.

"Hoje eu acordei mais cedo
Tomei sozinho o chimarrão
Procurei a noite na memória... procurei em vão.
Hoje eu acordei mais leve (nem li o jornal)
Tudo deve estar suspenso... nada deve pesar
Já vivi tanta coisa, tenho tantas a viver
Tô no meio da estrada e nenhuma derrota vai me vencer
Hoje eu acordei livre: não devo nada a ninguém
Não há nada que me prenda

Ainda era noite, esperei o dia amanhecer
Como quem aquece a água sem deixar ferver
Hoje eu acordei, agora eu sei viver no escuro
Até que a chama se acenda
Verde... quente... erva... ventre... dentro... entranhas
Mate amargo noite adentro estrada estranha
Nunca me deram mole, não (melhor assim)
Não sou a fim de pactuar (sai pra lá)
Se pensam que tenho as mãos vazias e frias (melhor assim)
Se pensam que as minhas mãos estão presas (surpresa)


                                 Mãos e coração, livres e quentes: chimarrão e leveza..." 
Ilex Paraguariensis – Engenheiros do Hawaíí

2 comentários:

Yuri Raskin Pospichil disse...

Muito verdadeiras essas linhas, muito sóbrias também. Sinto um algo de Caio F. Abreu em algumas passagens, porém...bem mais sincero e despretensioso do que qualquer coisa que ele já tenha escrito.
E comparado à outras linhas escritas por ti sinto um amadurecimento maior.
Como sempre, Parabéns Ana!

Bjus!

Ana disse...

Oh, querido, muito obrigado.
Teus comentários sempre são estímulos pra mim :)

beijos